quinta-feira, 26 de julho de 2012

A MODA E A SOCIEDADE

"Se me fosse dado escolher, em meio ao amontoado de todos os livros que serão publicados cem anos após a minha morte, um único exemplar sabe o que eu escolheria? Eu escolheria tranqüilamente, meu amigo, uma revista de moda para ver como as mulheres estarão vestidas um século após meu falecimento. E esses pedacinhos de tecido me diriam mais sobre a humanidade futura do que todos os filósofos, romancistas, pregadores e sábios.“
Anatole France
Prêmio Nobel de Literatura em 1921
O autor da frase acima recebeu Prêmio Nobel de Literatura, ou seja, é um escritor. E como tal, conhece muito bem a alma humana, sabe interpretá-la e sabe da importância de usar os elementos do vestuário na criação de um personagem para dizer quem ele é e evidenciar características da sua personalidade.
A moda é um fenômeno que está diretamente ligado às mudanças de hábitos, costumes e realidades sociais. A moda é um retrato sócio-econômico-político-cultural-religioso-geográfico da historia. E como retrato da história, permite enxergar através de si a evolução da humanidade, a substituição do antigo pelo novo. Saímos do tempo em que havia apenas modos de vestir e passamos a viver o que alguns consideram como a “ditadura” da imprensa e da indústria para consumo. Ao mesmo tempo em que esses padrões estabelecidos pela moda dão segurança e confiança, pois fazem a pessoa se sentir aceita na sociedade, eles reprimem e aprisionam, restringindo nossa liberdade de ser e de expressar. E por maior que seja a quantidade de grupos que possam existir em uma mesma época, estão todos vinculados aos mesmos limites, pois os diferentes grupos sociais fazem parte de um mesmo todo que interage entre si.
Mas, será mesmo a moda uma ditadura imposta por um grupo de pessoas à sociedade e a qual somos obrigados a seguir? Se alguém impõe a moda, esse alguém somos nós mesmos, a sociedade e o indivíduo. Somos nós que exigimos do outro que ele esteja na moda para que faça parte do nosso grupo.
Um exemplo clássico de que a moda não é imposta por um grupo de criadores e que as tendências surgem da própria sociedade é o “new look” de Dior.
Veja o exemplo:
2.2.1
Na segunda guerra mundial, os homens foram recrutados pelo exército e tiveram que ir para o campo de batalha. Suas mães, esposas, namoradas e filhas ficaram sozinhas e tinham que sustentar suas famílias.
Elas foram trabalhar nas fábricas, no comércio e nos escritórios. Precisam então usar roupas mais práticas e nem mesmo tinham vontade de se vestir de forma tão elegante quanto antes. Afinal, era um momento muito triste e difícil. Além disso, o governo impôs o racionamento de tecidos. Com poucas pessoas nas fábricas para produzir tecidos, a produção ficou muito pequena. Parte do tecido produzido era destinado para a confecção de uniformes de soldado e as pessoas podiam comprar muito pouco para costurar suas próprias roupas em casa.
Elas passaram a usar os chamados “sapatos de bom senso”, de couro preto simples, às vezes com salto anabela, com blazers sequinhos de ombros quadrados, saias retas na altura dos joelhos e chapéus pequenos. As bolsas ficaram um pouco maiores para poder carregar mais coisas. Não havia mais glamour nas roupas. Era tudo muito sem graça, com cores sóbrias e tecidos fáceis de manter.
Ao ver a mudanças nas roupas do início do século para essas aí ao lado, é fácil perceber que a mulher não podia mais ser tão vaidosa, tinha que ser prática e batalhadora.
Então, no meio de toda aquela tristeza, em 1948, o estilista Christian Dior mostra um conjunto de saia bastante ampla, com fartura de tecido e totalmente forrada, cintura de vespa, sapatos altos, chapéu grande.
A Câmara de Comércio Britânica ficou enfurecida. Com os homens afastados de seus trabalhos, lutando na guerra, os índices de produção haviam caído e o racionamento de tecidos continuaria até o ano seguinte.
Mesmo assim, contra a posição do governo, as mulheres aderiram ao chamado “new look” (que significa: novo visual). Não, por que exista uma “ditadura” da moda que obrigue as pessoas a vestirem as peças criadas, mas por que era a expressão do que elas sentiam.
O new look mostrava como elas queriam viver, longe de racionamentos, guerras e tristezas. Dior não inventou nem impôs nada. Ele apenas transformou em roupas o desejo de uma sociedade em um dado momento.
2.2.2



As décadas seguintes e seus movimentos reafirmam essa ligação direta entre a roupa e a sociedade. A moda hippie marcando o ideal de paz e amor no início dos anos 1970 e os punks com sua revolta contra o sistema no final da mesma década são exemplos. Nos anos 1980, as mulheres celebram a conquista de cargos executivos e de uma presença muito maior no mercado de trabalho. Elas queriam se mostrar ao mundo como executivas competentes, líderes capazes e responsáveis. E, mais uma vez, a moda acompanha e reflete uma mudança na sociedade. Ternos e tailleurs em profusão, roupas masculinizadas, androgenia e o uso em larga escala de ombreiras. Essas eram tão usadas, que a indústria de lingerie criou o sutiã com ombreiras. O visual de ombros maiores está diretamente ligado à maior responsabilidade, segundo estudos de psicologia.
Não nos contentamos em apenas cobrir nossas partes íntimas e nos aquecer.
Somos mais elaborados que isso. Queremos mostrar quem somos, a que viemos, o que pensamos. Queremos pertencer a um grupo e nos sentirmos iguais. Queremos ser diferentes dos outros e mostrar nossa individualidade. Queremos gritar nossas idéias através de nossas roupas ou escondê-las em baixo dos panos. E, como sociedade, usamos a moda com esse fim. Por isso, ela ocupa um papel tão importante em nossas vidas.

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